23 maio 2008

Cervejas Lambic e a Brasserie Cantillon


As cervejas Lambic

Os que estão um pouco mais interados no mundo das cervejas com certeza já sabem que existem duas famílias básicas, que se diferem principalmente por sua fermentação. São as Ales (alta fermentação) e as Lagers (baixa fermentação). Porém, podemos incluir uma outra família nesta lista, que é a das cervejas de fermentação espontânea (ou selvagem), conhecidas por Lambics.

As Lambics são cervejas bastante peculiares. Produzidas em uma região conhecida por Vale do Senne, de apenas 25 km², no entorno de Bruxelas, estas cervejas não levam adição de fermento durante o seu processo de fabricação, e este é o seu diferencial.

Após as etapas de brassagem e fervura, a cerveja é depositada em uma espécie de piscina de cobre. Nesta piscina o liquido irá resfriar, em contato com o ar. Ele deve atingir uma temperatura entre 18 e 20°C em pouco tempo, e isto explica um dos motivos da produção só acontecer entre os meses de outubro e abril, inverno europeu. Neste momento se inicia a parte mais importante do processo, que é a fermentação espontânea.

A estação fria é a época onde micros organismos conhecidos por fermentos selvagens se propagam pelo ar. No momento onde o liquido esta esfriando na piscina de cobre, mais precisamente quando ele está a 40ºC, estas leveduras o “atacam”, iniciando ai o processo de fermentação da cerveja. Após o resfriamento, o liquido é transferido para barris de carvalho, onde o processo de fermentação irá acontecer por algumas semanas. Durante este período, os barris são mantidos sem a rolha, pois a fermentação acontece de forma tão violenta que eles poderiam explodir caso fossem fechados. Após três ou quatro semanas a fermentação já ocorre de forma mais suave, e eles finalmente são tampados. Nesta etapa do processo, conhecida por maturação, a fermentação ainda continua de forma sutil, e a cerveja poderá ficar repousando por até três anos! Esta fermentação acontece somente nesta região onde as Lambics são produzidas, o que torna estas cervejas ainda mais especiais.

Após o final deste processo as cervejas são engarrafadas em garrafas estilo Champagne, com volume de 375 ou 750 mililitros. Recebem rolhas de cortiça e vão para as adegas, onde ficam acondicionadas horizontalmente. Passam, neste momento, pela segunda fermentação, dentro da garrafa, que pode durar alguns meses.

As cervejas Lambic, em sua forma natural, têm um sabor bastante rico, muito diferente de todos os outros estilos de cerveja. Pouca carbonatação e quase nenhuma formação de espuma, ácido, amargo, azedo, seco, doce, frutas, são características normalmente encontradas nas Lambics.

Gueuze e Lambicas Frutadas

Existe um estilo de Lambics chamado Gueuze. Nele, são misturadas produções de Lambic com um, dois e três anos. Com isso consegue-se um produto mais suave, com o adocicado presente nas mais jovens equilibrando com o amargor das mais envelhecidas. Nestas cervejas encontra-se um pouco mais de carbonatação e de formação de espuma.

Outro estilo de Lambics bastante difundido é o com adição de frutas. Frutas regionais como cerejas (Kriek) e framboesas (Framboise) são adicionadas à cerveja durante a maturação, fornecendo-a cor, sabor, aroma e açúcar. São cervejas com bastante frescor, e onde as características das frutas e a acidez aparecem como destaque.

Brasserie Cantillon
Em junho de 2007 eu estive em Bruxelas, onde conheci uma das mais tradicionais cervejarias que produzem Lambic, a Brasserie Cantillon.

Com quase um século de existência, a Cantillon é a única cervejaria familiar ainda em funcionamento dentre as centenas existentes na capital belga no século IX. Hoje produz 90 mil litros de cerveja por ano, mas já chegou a produzir 250 mil litros em 1958. A fábrica até parece um museu da cerveja, com equipamentos centenários ainda em funcionamento, ambiente rústico, iluminação difusa, e receptividade familiar. Em 1978 foi fundado o Museu Gueuze de Bruxelas, que funciona no mesmo local.

Visitantes são bem vindos, devendo atentar para os horários de visita que constam no site da empresa. Conhecer as instalações da fábrica e degustar uma das cervejas ao final sai por 6 euros. Durante a visita, alguns poderão estranhar algumas teias de aranha ou poeira pelo local. Pois há alguns anos aconteceu um fato curioso: a Vigilância Sanitária de Bruxelas ordenou que a Cantillon fosse totalmente pintada, deixando-a com um novo aspecto. Neste ano toda a produção foi perdida, pois não haviam as desejadas leveduras no ar!


A Brasserie Cantillon defende a forma original de produção de cervejas por fermentação espontânea, buscando demonstrar o seu valor na história e seu sabor diferenciado. Desde 1999 optou por somente usar cereais orgânicos em seus produtos. Os estilos hoje produzidos pela Cantillon são:

- Gueuze: Blend de lambics com um, dois e três anos, fermentadas na garrafa. Pode ser guardada por muitos anos.

- Kriek : Com adição de cerejas.

- Rose de Gambrinus : Com adição de framboesas.

- Vigneronne : Com adição de uvas brancas.

- Fou’foune : Com adição de damascos.

- Grand Cru Bruocsella : Seleção especial de lambics maturadas em barril de carvalho.

- Íris : Feita somente com malte pale ale, apresenta coloração âmbar e sabor e aromas típicos de fermentação espontânea.
- Faro : Com adição de caramelo e candy sugar. É adocicada, muito carbonatada e dura somente 3 a 4 semanas.

- Lou Pepe : Devido à fermentação espontânea, que não pode ser totalmente controlada pelo mestre cervejeiro, cada produção de lambics é diferente. Uma seleção das melhores produções é destinada para produção das Lou Pepe. Podem receber a adição de cerejas ou framboesas, deixando um sabor equilibrado e frutado, ou ainda serem somente uma gueuze. São as top de linha da Cantillon.

Matéria de minha autoria, publicada do Guia da Cerveja 2008

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